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Estamos sempre a busca do sentimento de desejo e queremos em alguém algo que nos complete. Enxergamos o amor como uma salvação da solidão, da incompreensão, dos transtornos desta vida. O amor, “cá entre nós”, está sempre do lado de lá do que somos, além de onde podemos chegar. Por isso, consideramos que ele nos completa.
Spinoza tem uma análise interessante sobre o amor. O filósofo que nasceu na Península Ibérica e viveu em Amsterdã, na Holanda, no Século XVI, considera que o amor é sentimento de pessoas incompletas. Só que é uma parte pode amar. Para ele, se ama por sabermos que desejamos o que não somos, o outro.
Reflita, pense bem, jogue um pouco seu olhar para dentro e relembre os amores que teve. O quanto o outro sempre foi o elemento que nos completa. O quanto desejamos o outro e projetamos sobre ele aquilo que nos falta. Se sentimos a ausência, a falta, é porque a presença nos dá uma possibilidade de passarmos a fronteira do que somos.
Porém, o pensador ibérico e cristão católico, que por ironia foi perseguido e combatido pelos próprios cristãos, considerava a questão do amor algo impossível para Deus. Spinoza argumenta que se Deus é um ser completo, nada lhe falta, como pode amar? Ele é uma totalidade, a natureza, que se expressa em nossas partes. Em cada elemento que criou e faz parte de sua existência. Somos uma destas partes.
Engraçados falarmos de partes quando estamos em um tempo em que as pessoas se consideram capazes de “amarem a si mesmas”. Como uma parte, um ser incompleto, pode amar a si, a própria condição imperfeita? Logo, para Spinoza esse amor-próprio é impossível.
Logo, temos que aceitar a imperfeito. Temos que admitir que vivemos uma parcialidade de um ser maior que se expressa em nós. Não somos independentes dos outros e parte considerável do que vai acontecer conosco se quer controlamos. Spinoza considera, inclusive, que nós não controlamos nada. Apenas devemos ter mais consciência da imensidão a qual pertencemos.
O amor, nesta concepção, deve sempre ser visto com o respeito ao conjunto da coletividade a que pertencemos. Nós é algo além de mim. Por isso, cada ser em si é uma expressão da totalidade, mas não é a mesma coisa.
O que é mais interessante nesta lógica, é que os fatos que julgamos cotidianamente como “certo” ou “errado”, “justo” ou “injusto”, são na prática fragmentos de uma totalidade que se sobressai, que determina, que é superior. Aquilo que consideramos um ato ilícito, injusto, na perspectiva de um sistema mais abrangente, sendo parte de um ser perfeito, pode ser necessário.
Considere este exemplo, olhamos um assassinato, uma atrocidade, um roubo, uma agressão. Por várias vezes, expressamos nossa indignação, “como pode Deus permitir que isso ocorra?”.
Porém, na totalidade da existência de Deus em sua complexidade infinita, assim como, o tempo no qual existe, a eternidade, como podemos considerar que o ato não faz parte de uma justiça que nosso olhar limitado não enxerga?
Desta forma, se considerarmos está lógica de Spinoza, a vida de um ser humano que ama, que busca de completar em outro, é a expressão de que tudo o que é criatura se completa em outra criação. Sendo assim, temos que ser humildes e admitir que em nossa condição limitada há algo além que pode colocar por terra o que acreditamos como verdade.
Por isso, imagine este mundo cheio de pessoas incultas, que pouco tem interesse em entender a complexidade dos elementos da existência. Estes seres que consideram que são completos e senhores absolutos de sua existência, acabam por viver no engano e, por isso, não sabem amar.
Porque o amor é a confirmação de nossa limitação, é a demonstração de que a existência do outro e o sentimento de buscar viver com e para ele nos aproxima de Deus, se quiser usar outra palavra, da nossa natureza e da perfeição. Mesmo que nunca possamos alcançá-la plenamente.
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