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Café, bola e bicho-de-pé

 

Na obra de Mário de Andrade, “Macunaíma, o herói sem nenhum caráter”, que a escrita antropofágica resume estas coisas que nascem lá fora e vem, como tantos vieram, se dar bem aqui dentro. Estou falando do futebol, expresso no chute na bola do personagem Macunaíma.

No capítulo VI, “A francesa e o gigante”, Macunaíma apronta com seus dois irmãos, Maanape e Jiguê, porque o último passava o dia dormindo e o primeiro bebendo café, o que impedia Macunaíma de erguer uma casa para eles três morarem.

Macunaíma transforma uma colher em um bicho-do-café para morder a língua de Maanape. E faz uma lagarta-rosada (tatorana) a partir de um pedaço de algodão para chupar o sangue de Jiguê.

Os dois irmãos, do herói brasileiro, ficam furiosos e planejam uma vingança: Jiguê pega um tijolo, mas sem querer machucar muito o irmão, e o transforma numa bola de couro. E na primeira jogada, passa para o irmão Maanape chutar, acertando em cheio o nariz de Macunaíma.

O herói reage: “Macunaíma teve raiva e atirando a bola com o pé bem para longe e falou: – Sai, peste! ” A consequência de seu chute: “O bichinho (do café) caiu em Campinas. A tatorana caiu por aí. A bola caiu no campo. E foi assim que Maanape inventou o bicho-do-café, Jiguê a lagarta-rosada e Macunaíma o futebol, três pragas. ”

Mas foi esta última, a praga do futebol, que pegou mais. Ela é inglesa, o café é etíope e as lagartas rosadas sempre estiveram por aí. Assim é o Brasil, de Vinicius e seus encontros e desencontros, de Darcy Ribeiro e o caldo formador e de Gilberto Freyre das raças que gostaram de “brincar”, como parodiando o sexo, Mário de Andrade, que se expressam em tantos lugares, também no futebol. Nada mais variado do que jogadores enfileirados lembrando os muitos brasis.

Ontem, com gosto de café amargo, que tenta fazer passar a dor de cabeça, com o coração queimando como uma Tatorana Mandruvá, a nossa paixão maior sentiu dor. Morreram Macunaímas, Maanapes e Jiguês, carregados de bicho-de-pé impregnados pelo futebol.

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