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Hoje vou contar um caso, destes, que poderia ter acontecido com qualquer um de nós, mas raramente acontece, porque rejeitamos a experiência.
Daniel, vive em um apartamento, não está disposto no fim de semana a fazer comida, desgastar-se na cozinha, não tem este dom. Compra um lanche. Não consegue devorá-lo em uma só refeição. Ele deixa o restante para a janta.
Fim de tarde, recolhe o lixo, leva para depositar no contêiner em frente ao prédio. Mas, um senhor vasculha os restos do prédio, na busca de algo para comer. Devora o que tem, naquele momento um pouco de arroz em um frasco de isopor.
Naquela impressão de que se deve agir, mas não se sabe como. Entre o conforto da indiferença ou a coragem de entender a situação. Daniel pergunta ao homem quem ele é. Alerta para a comida que pode estar estragada, oferece algo para alimentar o garimpeiro do resto da vida alheia. Ele aceita.
Retorna ao prédio, e ao subir a escada de volta ao apartamento, dividido entre o sacrifício da bondade e a facilidade da negação, fica entre o arrependimento do ato tomado e o orgulho de ter feito diferente. Perceber alguém, ato que a maioria das pessoas ignora. Na decisão de alimentar quem precisa, acabava de eliminar sua janta, o resto do lanche.
Nestas horas se percebe que ficar dividido entre o bem e o mal, ter um diabinho e um anjinho atentando os ouvidos não é simbologia. Um advoga sobre a mesquinhez da fome superficial, destas que satisfazemos com as banalidades como algo de valor.
O lado bom que busca nos inspirar tenta nos fazer entender que não vamos precisar de boa parte do que temos. E se podemos dar a alguém um pouco de vida, na forma que seja, de um lanche por exemplo, porque não. Não somos melhor que ninguém. O que me intriga é porque este lado é sempre tão doloroso de aceitar.
Daniel desce com a parte do lanche, leva água e conversa com o homem enquanto ele se alimenta. Quer conhecê-lo, pergunta sobre a vida, agora está disposto a ajudá-lo também sobre os sentimentos.
Conforme a conversa se desdobra, não se pode deixar de notar as pessoas que passam, olhando a cena de Daniel sentado no meio fio conversando com o “indigente”, como se fosse o encontro entre o que se espera e o que se nega ver. Uma parte não fala, mas condena pelos olhos. A estética da perfeição é sempre um ambiente de segurança para evitar nossas inquietações.
Outros pensam na lógica tosca de que alimentar quem precisa é como dar comida aos cães de rua, que sempre retornam querendo mais. Não queremos problemas. Logo, evite o contato, afirma o centrado em si mesmo.
Terminada a conversa, longa por sinal, satisfeito, o homem segue seu rumo. Daniel retorna a sua casa, ao apartamento. Nele, percebeu que a busca de entender e conhecer a vida do transeunte lhe foi mais uma lição do que um ato de caridade. Foi mais ajudado do que ajudou. A conversa lhe deu mais lições do que conselhos que pensou em dar. Logo, ele deu o que não lhe fazia falta e recebeu aquilo que lhe faltava. Acredito que caridade seja isso, uma via de mão dupla. Na qual a gente se nega a transitar. Por que?
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